domingo, 30 de setembro de 2012

VAMOS SAIR DA GAVETA?


            Sempre tenho visto, de uma forma recorrente, em alguns grupos de discussão destinados a escritores, roteiristas e afins, alguém perguntar como fazer para se tornar um escritor, lançar um livro ou até mesmo se tornar um autor de novela da Globo. Em todos os casos, a condição de iniciante do eventual profissional se torna explícita e em casos extremos, como o da última questão, a ingenuidade é latente.

De antemão já digo que, em casos desse tipo, a ingenuidade não é um pecado, ainda mais se o pretenso profissional não foi criado ou não vive no meio artístico para se inteirar com a dinâmica de absorção de novos profissionais pelo mercado literário ou audiovisual. E nesses casos a ausência de referência é um grande entrave. Até porque, para o bem ou mal, ser parente ou amigo de alguém “do meio” pode ser um fator determinante para o ingresso em um “mundinho tão fechado”.

Esse texto é exatamente uma pequena contribuição para os pretensos profissionais que têm, ou acham que têm talento com a escrita, mas não conseguem ou não sabem o que fazer para se tornarem profissionais. E já digo que para alcançar este intento, não há fórmulas prontas ou caminhos coloridos que desemboquem em um baú repleto de ouro. No entanto algumas atitudes podem fazer diferencial favorável se forem seguidas. De uma forma simples e direta, mas verdadeira as compartilharei com você. São elas:

 

1º Você deve ser muito criativo

A criatividade é uma característica congênita, ou seja, a pessoa já nasce com ela. Ela pode ser lapidada com a leitura de bons livros, assistindo bons filmes, boas peças de teatro e fazendo bons cursos. E nesses casos quando digo bons, não estou canalizando a questão para gêneros. Tenha acesso a tudo: Drama, comédia, terror, tudo... Quanto aos cursos. Saiba que não existe algum que possa torná-lo criativo. Corra dos que prometem isso. É mentira, puro caça níquel. A criatividade pode ser lapidada. Os cursos podem ajudá-lo a se tornar MAIS criativo. Nunca torná-lo criativo. Essa é a mais pura verdade.

Como se não bastasse, a criatividade deve estar voltada para a escrita, que é o início de tudo. Algumas pessoas são muito criativas, mas a sua criatividade está relacionada com outros campos de atuação. Se você não é criativo e não tem aptidão para a escrita. Dificilmente será um escritor, dramaturgo ou roteirista.

 

2º Seja um bom observador;

Se você perguntar a um escritor profissional o que é necessário para ser um bom profissional, seguramente ele te responderá: Leia muito e leia bons livros. Ele está corretíssimo, mas antes disso você deve ser um bom observador. É com a observação que você despertará a sua inspiração. Aprenda a observar. Observe as pessoas, as notícias, os fatos e acontecimentos. Tudo é motivo para se inspirar. Abra os seus campos sensoriais para o mundo e você verá que não haverá necessidade de se refugiar em uma casa de praia ou da colina em busca de inspiração, porque os elementos estão por toda a parte só esperando que você os note.

 

3º Goste de escrever;

O gosto pela escrita é algo que deve ser inerente a você. Algumas pessoas não têm paciência para escrever. Não conseguem se concentrar. Querem se tornar roteiristas ou escritores, tão somente por causa do glamur e o eventual assédio das pessoas. Ao se perguntar por que você quer ser escritor e o fator determinante for o glamor, festas e o dinheiro, definitivamente esta não é a sua área. Até porque, de modo geral, não há glamur em ser escritor. Mas se você só consegue ver isso como meta, esqueça! A escrita não é a sua área.

 

4º Domine o português;

Algumas pessoas têm uma facilidade em dominar o português, outras não. Se este for o seu caso, não tenha vergonha. Estude. Faça cursos. Um projeto com erros na escrita certamente vai “depor” contra você. Tenha sempre em mãos uma boa gramática e um bom dicionário. O português se aprende.

 

5º Goste de ler;

Leia. Leia muito. Livros, textos de peças de teatro, roteiros de filmes, jornais, revistas, bulas de remédio. Aqui também não se restrinja a gêneros. Leia obras dramáticas, juvenis, de terror, de ficção. Se abra para todos os gêneros e tente se preparar para ser um escritor ou roteirista “pau para toda obra”. Lembre-se que se você se tornar um profissional, poderá escrever aquilo que te encomendam. Não exatamente o que você quer escrever.

 

6º Goste muito de você;

Como assim? Poderás perguntar. Ocorre que a profissão de escritor é genuinamente uma profissão solitária. Logo, você tem que se resolver muito bem sozinho. Gostar de estar só e até tirar proveito da solidão. O que não estou dizendo para que você se feche ao trabalho em grupo. Pelo contrário, também terá que saber trabalhar em equipe. Mas o trabalho em equipe não é uma regra nesse meio.

 

7º Seja verossímil;

Ser um bom escritor ou roteirista não significa escrever a La Ruy Barbosa, ou seja, escrever rebuscado e difícil. Pelo contrário, um livro ou um filme, via de regra, são obras de cultura de massa, ao menos que o público alvo seja específico (uma classe ou categoria profissional, por exemplo). Escrever de forma simples e direta é uma obrigação. Alguém já disse que escrever difícil é fácil, o difícil é escrever fácil (ou foi mais ou menos assim). E essa é uma grande verdade. Você pode escrever de uma forma muito difícil, que só você compreenda, mas tornar a sua obra altamente compreensível sem subestimar a inteligência do público é uma grande arte.

Em tempo; a construção de boa narrativa ou bons diálogos devem estar em consonância com a realidade e o tema com os quais você esteja retratando, o que não significa necessariamente o uso de palavras difíceis ou pouco usuais.

 

8º Controle a ansiedade;

Nunca envie o seu projeto sem ler e revisar diversas vezes. A cada nova leitura você vai notando que pode melhorar e até encontrar erros de português ou de digitação, o que pode comprometer a aceitação do seu projeto. E cuidado com os corretores de texto. Eles são sistemáticos e erram muito.

Saiba que muitos produtores são maleáveis com o português, outros não. Aliás, têm alguns que se prendem a escrita e não a idéia ou a narrativa. Acreditam eles que são professores de português.

 

9º Saia da gaveta;

Muita gente tem talento, mas é acometido por preguiça, receio ou comodismo de tornar públicas as suas obras. Tire-as da gaveta. Saia da zona de conforto. Dê a cara para baterem. Efetue o registro na Biblioteca Nacional. Espere receber o certificado de registro e depois mostre ao “mundo e ao fundo”. Mostre aos seus amigos, parentes e aderentes. Mas nunca confie plenamente na opinião dessas pessoas. Tenha bom senso. Amigos e parentes não querem magoá-lo e se o que você escreveu for muito ruim, eles poderão não revelar isso ou não dirão nas palavras que você deveria ouvir. Nunca pergunte o que a pessoa achou. Pergunte o que você acha que deveria mudar ou melhorar.

 

10º Trace metas;

Muitas pessoas são brilhantes. Mas tem tantas ideias e projetos que querem fazer tudo ao mesmo tempo. Acabam atropeladas pelos próprios projetos, desistem de prosseguir na empreitada e acabam por nunca concluírem coisa alguma.

Trace metas demarcadas por tempo. Anote esquematicamente o que você vai escrever ou apresentar. Esboce fases para cada projeto. Primeiro o que você vai escrever. Depois para quem vai enviar e assim por diante. Só passe para um novo projeto quando você esgotar todas as fases do anterior. É melhor ter poucos projetos concluídos e enviados para as pessoas certas do que ter muitos sem que sejam concluídos, o que equivalem ao nada absoluto.

11º Torne-se público;

Torne seu nome conhecido (de uma forma digna, claro!). Essa é a parte mais fácil de todas. Crie um blog, um site, faça parte das redes sociais. Escreva sobre suas experiências, sobre o que você está fazendo. “Venda a sua imagem” ou melhor o seu nome. Quando montar a sua página saiba que estará a mercê de todo tipo de gente. É um preço que se tem a pagar. Se agredido gratuitamente, não brigue calorosamente. Evite baixaria. Nunca retruque com palavrões. Saiba que você está sendo visto. Mas também tente tirar proveito da agressão. Interaja com o agressor de uma forma sarcástica, irônica e debochada. Os pequenos arranca-rabos também tornam o seu perfil movimentado. Em caso de agressão extrema ou calúnia grave, saiba que o eventual caminho será a Polícia mesmo. E isso serve para você e para os outros. Portanto, cautela com as palavras.  

 

12º Conheça pessoas;

Siga e tente ser amigo virtual de produtores, diretores, escritores, dramaturgos e roteiristas renomados. Tente interagir com eles. Mas respeite as particularidades de cada um. Nunca puxe assunto sobre a vida pessoal deles. Se estiverem envolvidos em polêmica de ordem pessoal. Se finja de morto, a não ser que a própria pessoa dê margem para isso, ao fazer algum comentário na própria rede social. Nesse caso, dê o seu apoio moral singelamente. Sempre esteja atento ao que eles fazem no campo profissional e se eles merecerem, elogie. Não se constranja em elogiar. Só não seja puxa saco. Isso soa falso. Eles irão perceber e você não vai ser respeitado. Só vai ser visto com um mero seguidor.

 

13º Seja o alvo e não a flecha;

Se quiser ser escritor, dramaturgo ou roteirista. Saiba que você será o alvo e não a flecha. Não publique notícias das celebridades ou de fofocas, também não seja um crítico. Evite emitir opinião sobre as obras alheais em seu site. Ainda que o que você pense seja a mais pura verdade. Saiba que neste meio os egos são muito inflados e o que você escreve desfavorável a alguém pode se voltar contra você em um futuro próximo.

Enfim tente ser criador e não crítico do criador. Esteja do “lado de cá” e “não do de lá”.

 

14º Vai atrás das oportunidades.

Depois de seguir todos estes passos, vai a busca das oportunidades. Afinal, de nada adianta você estudar, se aperfeiçoar, ser um criador brilhante, se não encontrar quem se predisponha a ver o que você escreveu. Para o pretenso escritor, existem inúmeras editoras que têm departamentos especializados em receberem e analisarem originais. Naquele famoso site de busca, pesquise as editoras que estão recebendo originais. Leia com atenção a política de recebimento. Ou se preferir vai até uma livraria e nos diversos livros que lá estarão, atentem através dos selos impressos, anotando o maior número de editoras que você puder. Depois entrem no site de cada uma e veja se elas recebem originais. Veja o catálogo de obras já lançadas e compare se a sua obra está dentro do perfil da editora. De nada adianta enviar uma obra de ficção se ela só publica livro de auto-ajuda, por exemplo.

Em relação a roteiro de filmes, vão no site da associação brasileira dos produtores independes. Entre no site de cada uma da produtoras e façam o mesmo do que foi descrito no parágrafo anterior.

Quanto a TV a coisa é mais complicada. A TV Globo NUNCA vai analisar sua sinopse. É recomendação do departamento jurídico mesmo. Os autores, diretores ou produtores não podem analisar originais de quem não é da própria emissora. Faça o que eu disse até aqui e espere a Globo vir atrás de você. É ela quem recruta roteiristas. Não é você quem vai recrutar a emissora.

Quanto as outras emissoras eu não sei. Mas acredite, se você não for conhecido, sua sinopse não vai ser analisada sob hipótese alguma. Se você já estiver seguro pode tentar as emissoras de TV estrangeiras. Vejam as do Chile, Colômbia, Portugal e de Angola.

Bem, essas são algumas dicas que este que vos escreve tem para compartilhar com você. Depois de muito pesquisar e entender como funciona o mundo da escrita cheguei, por conta própria, a tais caminhos. Estou seguindo tudo isto a risca. É muito difícil e confesso que já pensei em desistir, mas é bem melhor que se submeter ao “teste do sofá”. Se é que ele existe nesse meio.

Enfim, saia você também da gaveta. Numa época em que até “sair do armário” já não é algo tão custoso. Não é uma mera gaveta que vai ser um entrave na busca dos nossos sonhos, não é mesmo? E sucesso para todos nós.




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