Como todos bem sabem, 2004 foi uma
ano bastante marcante para a televisão brasileira, porque foi a partir dele,
que a Rede Record decidiu se tornar verdadeiramente uma televisão competitiva e
fazer frente a Rede Globo. Para tanto contratou muita gente boa, investiu em
tecnologia de ponta e diversificou a sua grade de programação. Os resultados
foram aparecendo e ela se tornou a emissora vice-líder.
Mas o setor que mais recebeu
investimentos e trouxe inegáveis resultados, foi sem dúvida o da
teledramaturgia, que culminou com a construção do Recnov. Obra que representa
de forma “palpável” a evolução da emissora no quesito de produzir novelas, bem
como algo bastante significativo no que se refere a expansão do mercado da
teledramaturgia. Iniciativa que merece ter voltada para si a torcida de todos
nós.
Mas antes que os eventuais
amantes da Globo queiram me empalar, lhes digo que também torço pela
continuidade da sua inquestionável e qualificada teledramaturgia, desde que não
seja desacompanhada de uma concorrente a altura, porque a história da
humanidade demonstra de forma irretorquível que o monopólio é uma merda!
Em verdade, não torço por alguma
emissora específica, posso dizer que torço pelo sucesso da expansão da teledramaturgia em geral. Porque
por tabela desejo a manutenção da ampla concorrência e o crescente número de
vagas no mercado de trabalho para todos os profissionais que lidam com este
tipo de arte.
E para quem torce por
concorrência, há muitos motivos para se animar, pois desde que me entendo por
gente, há mais ou menos trinta anos, pela primeira vez percebo que a emissora
líder arrumou uma concorrente digna de respeito. Pois, não se pode negar que em
matéria de objetivos e resultados de qualidade técnica, a emissora do Bispo
Macedo tem sido a que mais se aproximou da “Vênus Platinada”, entre todas que
já tentaram.
É claro que todo embate, requer
altos e baixos, mas é preciso que se diga que a Record tem duas “armas” com as
quais a própria Globo se utilizou para alcançar a liderança: a ampla vontade
com objetivos bem definidos e verdadeiras condições financeiras.
Mas apesar de todo o investimento
e os bons resultados colhidos, é mesmo possível que a Record (ou qualquer outra
emissora) possa alcançar ou até ultrapassar a Globo na sua condição de maior
emissora do país? Esta é uma indagação que aposto ser recorrente, até dentro de
própria Record. Então vejamos...
Em que pese ser mais fácil para
este que vos escreve tentar responder esta indagação, tão somente dizendo que
nada é impossível, porque de fato não é. Prefiro seguir o caminho um pouco mais
tortuoso, porém mais concreto. Para resumir: vou responder que é possível e dou
um exemplo bem oportuno.
Pois bem, há mais ou menos quinze
anos, em Portugal, a SIC reinava absoluta no quesito audiência, tendo vez por
outra a RTP a dividir as atenções do público. Eis que a TVI resolveu investir
na sua programação e para tanto, contratou pessoal, se modernizou e investiu
maciçamente em teledramaturgia. Ou seja, fez o que Record está fazendo.
Hoje a TVI é a emissora líder na
“terrinha”, embora a SIC esteja reagindo. E é necessário que se diga que o
gosto dos portugueses é semelhante ao dos brasileiros, ao menos em matéria de
telenovelas. Inclusive as novelas da Globo sempre foram praticamente exibidas
de forma rigorosa pela SIC. Ou seja, lá a emissora fez o que parecia
impossível: Desbancou as produções da emissora dos Marinho.
Atualmente a TVI tem uma linha de
produção semelhante a do Projac. Só que lá, as produções são um pouco mais
modestas. A grade de programação segue tendo em média quatro novelas no ar, em
esquema parecido com o da própria Globo, inclusive foi exibida uma soap opera
de nome “Morangos com Açúcar” que foi transmitida durante quase dez anos e se
encerrou em setembro do ano corrente (foi a “Malhação” de lá).
Pois creio que a Record percebeu
ou deveria perceber que toda e qualquer emissora de TV que queira crescer, ou
ao menos se manter em uma posição confortável se comparada com as demais, deve
investir de forma vultosa em teledramaturgia. É ela que fideliza o público e
afirmo com toda a certeza do mundo que a própria Globo só chegou onde chegou, por
conta da grande aposta que fez nessa área.
Espero que perceba também que
antes de tudo, telenovela é história, é texto. Consequentemente texto é autor.
Pimba! Era aqui que eu queria exatamente chegar. O êxito ou fracasso de uma
novela deve ser creditado INICIALMENTE ao seu autor. Pois os novelistas, estes
seres iluminados e praticamente raros, podem ser “o fiel da balança” na disputa
pela audiência.
Sem demérito algum aos outros
profissionais, é uma história muito bem contada que o público quer ver. E a
prova disso é que já existiram superproduções que fracassaram, ao tempo em que
novelas com nuances de produções simplórias tiveram um sucesso retumbante: o
mérito ou demérito, em ambos os casos se deve inicialmente aos seus autores.
E quando me refiro a boa
história, não tenho em mente necessariamente uma obra de inegável qualidade
textual, mas a algo que traga para si a atenção da maior quantidade de público e
o bom autor, ao menos nos parâmetros dos dias atuais, é aquele que consegue
esta proeza cada vez mais difícil. É aquele que aguça a sua perspicácia e se
torna sensível para imaginar o que o grande público está predisposto a assistir
durante meses.
Logo, os profissionais que
oferecem verdadeiras condições de fazer com que a Record se torne uma
concorrente verdadeiramente oponente para a emissora líder, são justamente os
autores de novelas. Uma novela de sucesso faz com que sua boa audiência se
reflita para outros “programas da casa”. Um fenômeno curioso, mas que é
verdadeiramente real, vide a atual versão de “Carrossel”, que tem ajudado a tirar
o SBT do sufoco. Inclusive, interferindo na média da audiência do dia da emissora
do Seu Silvio.
Então aqui cabe uma pergunta: O
que fizeram os autores da Record desde 2004, que ainda não a catapultaram ao posto de emissora líder?
Pois eles estavam preparando o
terreno e começando a chamar a atenção do público, porque este é justamente o
trabalho da comissão de frente: chamar a atenção para si a fim de demonstrar o
que vem em seguida. Nesta condição vieram a escrava, os mutantes, novela no
morro, no pantanal, novela sobre a máfia... Todas com grade êxito, dentro da
realidade da Record. Em contrapartida também vieram produções que não
alcançaram boa repercussão, mas foram importantes porque eventualmente
apontaram o caminho a não ser seguido.
Em outras palavras, coube a eles
começar a atrair espectadores para a emissora e a fazer com que fosse dado início
a criação do hábito em torno das suas produções e bem sabemos que hábito é algo
que não se cria da noite para o dia, pelo contrário, requer tempo. Um tempo que
se confronta com o gosto pelo imediatismo dos excutivos de TV e esperemos que estes
sejam pacientes nesse sentido.
Mas novos horizontes devem ser
abertos, inclusive no sentido de se procurar produzir a história que seja o
“Roque Santeiro” ou o “Pantanal” da Record e demonstre de forma insofismável
que alcançar a líder, apesar de ser uma tarefa muito difícil, não é impossível.
Acredito eu, que com o passar do
tempo, as cobranças em torno de maiores resultados poderão ocorrer, se é que já
não estejam ocorrendo. Mas o que fazer? Onde está a novela prometida?
Gostaria de ter esta resposta,
mas os profissionais que eventualmente possam escrevê-la podem estar dentro ou
fora da emissora e digo mais: Podem nunca ter escrito uma novela. E isso é
possível? É. Pois que todos os grandes autores, principalmente os da primeira
geração, começaram praticamente sem uma experiência televisiva anterior.
Na atualidade, o exemplo maior
vem de dentro da própria Record, pois sua autora Gisele Joras, após vencer um
concurso, foi incumbida de escrever “Amor e Intrigas”, na minha opinião a novela
mais redondinha da emissora, até a presente data.
É bom que as perspectivas da
Record não se limitem a tentar tirar autores da Globo, o que vai ser uma tarefa
cada vez mais difícil, porque, com as constantes perdas - atualmente a do grande Carlos Lombardi -, a emissora do plim-plim vai se blindar de todas as formas
possíveis, inclusive oferecendo o céu (e o inferno) para segurar seus
profissionais.
Então, as possibilidades estão
por todos os lados, também por conta dos que estão fora, inclusive entre quem
ainda não teve a oportunidade de escrever uma trama televisiva. Apesar de que, como
já disse um renomado autor, um eventual grande novelista seja tão raro quanto
um diamante azul. Eu posso dizer que não podemos duvidar da sua existência. Eles
só estão escondidos, bem reluzentes, esperando a sua descoberta. Record, é bom
se abrir para novas prospecções...